30 de set. de 2007

Insights & Epifanias

debaixo de tudo vestidos de nada
restamos após a luta pele, suor, sangue
belo embaralho de peitos e pernas corpos sobre corpos
a matéria do desejo impressa na respiração
revoluteando sobre si mesma sobre um outro incomensurável
já teima em ocupar espaço demais esgotado do gosto alheio
e ainda assim ansiando insights & epifanias
não mais as mesmas sim outras que não cabem em si
de tanto movimento um sobre outro um e outro
sobressaltados os dois no mesmo delírio insatatâneo
desferindo golpes talhando um amor à flor
da
pele

Sandro Ornellas
(Trabalhos do corpo. São Paulo: Letra Capital, 2007)

Eu coloquei um fim no meu reinado. Compreendi que era uma borboleta presa numa teia de aranha. Não, não precisei de outra epifania para chegar a tal conclusão. Bastou uma música, uma dor, este poema. Tão estranho e maravilhoso quanto meu corpo. A primeira verdade, segundo Sandro e Clarice.

9 comentários:

Luiza disse...

Este poema eh super bonito!
Beijos

Anônimo disse...

"Ad impossibilia nemo tenetur"

já dizia meu velho pai..

Anônimo disse...

Poema interessante. O Sandro é um poeta Interessante.Borboletas vivem pouco, mas aranhas menos ainda, porque sabem bem como são crueis as borboletas quando estão livres

sandro so disse...

Fiquei honrado, Senhorita R.

Anônimo disse...

To com saudades!

(por esse comentário, você não esperava...)

Palatus disse...

Que Sandrade...otimo poema. EStou me perguntando: será qie já vivi minha epifania e não percebi?
Obrigado pelas leituras, Renata.
Parabéns!

Vivz disse...

Fiquei muito feliz com as boas novas! E me chame sempre de Vivoca. É muito lindo. Hahaha.

O Sibarita disse...

Sua menina que poema porreta!

Uma manifestação divina em plena primavera de anseios e desejos à flor da pele!

E viva o dia de Reis! Foi nesse dia foi? kkkk

Oi fia eu não sumi não! kkk É o trabalho que tá me tomando o tempo, viajando...

Você acha que eu ia lhe abandonar é? kkkk Sou igual a araldite... kkkk

Ei, jamais eu abandonaria minha conterrânea boa de escrita, aqui, eu aprendo e muito viu dona moça?

Ah quero agradecer a Fernanda Garibaldi pelo comentário na postagem "Neste papel onde também me escondo..."

Sabe Fernanda a vida realmente é dura para quem nasce na mais pura pobreza sobre as pontes, na maré sem escolas, sem lazer, sem posto de saúde etc, etc... Mas, no entanto, é um estímulo para todos aqueles que apesar de tudo e desde cedo mariscando para ajudar a família almeja e sonha um dia sair daquilo para ter uma vida digna e possa ser no amanhã um exemplo, um incentivo aos seus e aos que lá estão ou estiveram.

Foi assim e falo humildemente que eu e outros conseguimos ser alguém, chegar lá como dizem por ai... Eu continuo o mesmo de sempre sem essa de EGO pelos céus da cabeça, porém, faço a minha parte apesar de não morar mais no Jardim Cruzeiro, hoje, Vila Rui Barbosa, meu pai ainda mora lá, sempre estou indo às escolas da cidade baixa e em especial as que estudei levando palavras de estímulos e mostrando que quando nós queremos podemos mudar o jogo sem essa de ficar se lastimando que vida foi ou é cruel, tudo depende nós e do que queremos no futuro que é logo ali na dobrada de qualquer esquina...

Minha querida Renata desculpe-me ter-me alongado assim no seu belo Blog, é que a Fernanda, foi tão generosa comigo no comentário que achei por bem agradecer. Ainda, torrando sua paciência e desculpe-me mais uma vez deixo uma poesia chamada ALAGADOS que é a minha vida na época para que ela possa entender mais um pouco.

Se zangue não viu fia? OBRIGADO!

Alagados (Palafitas)

Em homenagem aos meus amigos de infância.
(Especialmente aos que se foram levados pela maré de março e ou caindo das pontes: Helena, Chica,
Deusinha, Toinho Magriça, Mário Nagô, Carlinhos negão, Valtemir, Vando Bandolo, Gilson Caruru, Marquinho...)

Estes versos,
são memórias e sonhos
da maré como lembrança
nos desejos da infância
vivida nas palafitas...
De pés descalços
correndo sobre as pontes
catando raios de sol
nas asas de um beija- flor!
Meu coração tinha enredos.
Melancolia e fantasias
palpitavam como folias
e desfilavam sem alegorias...

À noite
os momentos eram
infinitos, um fifó aceso
espantando a escuridão,
gatos lânguidos esfomeados,
ratos correndo dos algozes
e tamancos rachados
fugindo da leptospirose...

O tempo à noite
sempre se estendia.
Eu tentava empurrá-lo
com as mãos, pura agonia!
Ele teimava desfilar, entre
os meus dedos lentamente...
Segundos, minutos, horas e dias.

Parava o tempo!

Uma Ave Maria e um Pai Nosso
para amenizar o sofrimento...

Pela fresta,
via-se as últimas gotas
de estrelas trêmulas,
circulando sobre
tábuas podres sobrepostas
e esqueletos de caibros
sob a lua, que ludibriava os telhados...

O dia
florescia na enchente
atiçada pela maré de março.
Em cada barraco, olhos velados
retiravam o que tinham e o que não tinham.
Sufoco! O povo dos alagados
recorria a todos os santos
sob a luz de um sol minguado...
Correi marezeiros!
Há nas pontes
dependurados e sombreados:
desejos da vida, sangue em lágrimas,
trapos velhos e penicos furados
rasgando o ventre dos sonhos
sempre macerados!

Bocas de caranguejos
asas de morcegos
e nenhuma flor como desejo...

A maré cheia
convidava ao mergulho.
Crianças davam caídas,
era o prazer do corpo na água,
o debater de braços e pernas, nadar!
Ingenuidade da flor idade...
Na borda do prazer,
a cilada montava o cenário
entre lixos, galhos e estacas.
O perigo era fatal... Tarde demais!
No azul, um sol de tempestades.
A morte era crua, a felicidade era fugaz.
Na adversidade, mais um que se vai!
Erguia-se um silêncio,
havia uma alma desesperada,
em fuga, pedia a extrema-unção!
A tarde uivava, a dor se curvava
e nenhum padre, nenhuma benção,
mas, a noite te virá em orações!
Naqueles momentos,
a maré cumpria a sua sina.
Vestia-se de cinza
e nos desesperos das lágrimas,
uma chuva fina...

Mas, não sei, era paradoxal!
Pratos vazios, tripas em revoluções
urubus, cachorros e ganhamuns
lutavam por comidas na beira mangue.
Siris magros e mariscos aferventados
crianças amareladas exangues!
O prato se repartia, mercúrio disputados,
enquanto, amebas e lombrigas faziam greve de fome...

Novo dia chegava,
com ele, dona esperança
enganava a fome, a miséria!
De fininho ela saia se jogando das pontes,
comida para barrigas vazias!

Nos telhados, a morte
despudoradamente ria,
filmava a cena de binóculos
na aba de pratos sonhados...

Sob um céu de jade,
natal chegava com luas estreladas!
Nos nossos olhares quanta alegria
escondendo a dor, a melancolia...
Os barracos eram enfeitados,
no piso de tábuas carcomidas
a areia branca dava um toque mágico,
nos alagados enfim, tinha vida!
Nos jarros de barro,
galhos de pitanga e espada de Ogum,
folhas de arruda presas nas portas,
sal grosso nos telhados e alfazema
para espantar os maus olhados,
gatos pretos ludibriados...

A noite era o olhar e viria em clarões!
Nas janelas nenhum chinelo, nenhum tamanco.
Papai Noel nunca vinha, ele disfarçava, enganava
e nem ao menos um presente, uma bola, uma boneca...
As crianças da maré sonhavam descalças!

No fundo de nós,
uns olhos de tormentos
torturados por natais iguais,
à procura de manhãs desiguais!

Valei-nos, Jesus menino!
Lembrai dos vossos pequeninos,
em vossas mãos os nossos destinos!

O Sibarita

Senhorita B. disse...

Gitá: volte sempre!

Sucks: tb estou com saudades! Amo você!

Para todos os outros:
Vocês, meus leitores mais participativos, são o leimotiv desse blog.

Beijos para todos!