10 de ago. de 2008

Meu querido,


Prólogo: Era uma vez um homem bem magrinho que achava que teria um filho. Mas, no treze inesperado, veio a surpresa: a bebé tinha os olhos claros por ele desejados, mas era menina. E o que, então, fazer com uma filha? Era uma vez um pai e uma filha muito passionais, parecidos até no jeito de discordar sobre tudo. Tudo. É essa palavra que define o enorme amor que sinto por você.


Meu querido pai,


É nesse espaço que busco a Senhorita B, aquela que fugiu, e acho curioso poder me encontrar com você num lugar marcado por ausências. Mas as palavras têm essa força: elas aproximam todos que nelas acreditam. E, sim, eu deveria deixar isso apenas para o livro, só que não consigo me conter e repito: são as palavras os meus principais vestígios.

Não, não sou sempre uma moça triste e doente que baila pelo salão sozinha. Estava, antes, no lugar errado e, por isso aquelas dores no corpo. Tenho gostado bastante da minha última farsa: a menina livre, preocupada apenas com unhas descascadas, ignorando o mal do mundo, sempre de férias do peso de ser quem é. Talvez isso explique porque não tenho sentido mais medo da mediocridade: ela possui uma encantadora leveza, uma enorme indiferença às indelicadezas dos outros.

Sim, meu pai: eu vinha fugindo daquela que vive em mim do mesmo jeito que Donatella vem fazendo nos últimos capítulos da novela. Só que tenho olhos grandes e, ontem, sonhei com a capa do meu próximo livro. Portanto, guardei o figurino da moça fluida e vesti novamente a farda que me observava muda do armário. Já de óculos de grau (óculos é uma palavra estranha, não? ) voltei a precisar do mundo na forma qual eu o conhecia. E tenho, misteriosamente, sentido uma alegria enorme com esse retorno de mim mesma. Ao mesmo tempo que a "saudade de casas demolidas", expressão criada por Vanessa, toma conta de mim.

Talvez essa carta esteja ficando longa demais. Mas, como estou fora, penso que tenho obrigação de escrever muito para justificar minha ausência. Culpa? Já morro de rir só em pensar na sua cara, neste momento. Ela deve ser algo no estilo Renata-é-mesmo-uma-pessoa-muito-complexa. Lembro-me do dia dos pais em que lhe dei o DVD de Nina Simone e você detestou, falou, em segredo, para Suzanno que esse era o pior presente que já tinha ganho. Pai, de você, com certeza, herdei esse meu inabalável senso de humor.

A carta pode estar complicada. Mas muito simples é o amor que sinto por você. E saiba que estou perto sempre. Guarde meu paradeiro como um segredo. Não, não é bom revelar tudo aquilo que mora no nosso coração.

De sua filha que te ama muito.

Cheia de saudades de casas demolidas,

Renata

7 comentários:

Anônimo disse...

Já avisei:

Ou você escreve sobre o "Perfume das Coisas que Dão Certo" ou tudo poderá amanhecer diferente.

Rômulo

aeronauta disse...

Renata, quando você vem?

aeronauta disse...

Renata, quando você vem?

L. Rafael Nolli disse...

Olá, Renata! Que carta, hein! Nossa, achei tudo de uma sinceridade, ainda que seja ficcional - não sei se é - tudo me pareceu forte e honesto: além de muito poético! Gostei! Abraços!

Anônimo disse...

"Guarde meu paradeiro como um segredo. Não, não é bom revelar tudo aquilo que mora no nosso coração." Concordo e acho lindo.

Vivz disse...

Então acho bom vc escrever logo sobre "O Perfume das Coisas que dão certo", pq Rômulo é um homem de palavra. Hehehehhe. Bjs.

Menina da Ilha disse...

Minha mãe dizia que meu pai queria me fazer de homem. Isso porque me levava para a oficina, ia lavar o carro, me ensinou a dirigir e muitas outras coisas. Agradeço e sinto falta de cada momento que passamos juntos. Que bom que quer me conhecer.Venha. Amiga de Aeronauta é minha amiga também.