23 de abr. de 2008

No dia dos direitos autorais: considerações sobre Paris Hilton e Darfur


No mês passado, entreguei meu trabalho de conclusão da especialização. Escrevi sobre o direito à intimidade nos tempos modernos. E, em vários momentos, me deparei com a necessidade de discutir o choque deste com outros direitos fundamentais.
Parecia que eu estava adivinhando o que iria acontecer... Dias depois, o caso Isabella Nardoni explodiu e tornou meu tema super atual. Na ocasião da elaboração da minha monografia, me fiz várias perguntas que, agora, voltaram com força total. Quais são os limites da liberdade de expressão? Pode a mídia divulgar de forma tão ostensiva a suposta intimidade do casal Nardoni? Caso o casal seja levado a julgamento, já não estariam os componentes do Tribunal do Juri relativamente influenciados pela comoção pública?
Sim, não é fácil responder tais questionamentos. Trabalhar com colisão de direitos é sempre extremamente complicado.
Pois bem, hoje, no dia dos direitos autorais, li a notícia sobre a polêmica causada pela figura acima. E, mais uma vez, me perguntei: pode o direito de expressão prevalecer sobre os direitos autorais? Duvidas não restam da representação pejorativa de uma bolsa Louis Vitton no desenho.
Defendendo seu trabalho, a criadora da gravura afirmou; "Minha ilustração SIMPLE LIVING é uma idéia inspirada pela cobertura da mídia a coisas completamente sem sentido. Meu pensamento foi: uma vez que não fazer nada, mas usar bolsas de designers e cachorros pequenos e feios aparentemente é suficiente para te colocar numa capa de revista, talvez valha a pena para as pessoas que realmente merecem e precisam de atenção. Quando as mesmas imagens nos são apresentadas continuamente, nós começamos a acreditar que elas são importantes. Quando estava lendo o livro "NOT ON OUR WATCH", do Don Cheadle e do John Prendergast esse verão, fiquei horrorizada pelo fato de que mesmo com o genocídio e outras atrocidades em Darfur, Paris Hilton era quem estava atraindo toda a atenção. Será possível que o mundo do entretenimento dominou o nosso bom senso? Se você não pode ganhar deles, junte-se a eles. Por isso escolhi misturar a realidade cruel com elementos do showbiz no meu desenho. Quando você vê maneiras de ajudar Darfur no website: www.savedarfur.org, entre outras coisas, ele diz: Levante a conscientização. Levante fundos. Então é isso que estou tentando fazer. 100% dos lucros com a camiseta e o poster do SIMPLE LIVING são doados para a Divest for Darfur."
É óbvio que a marca Louis Vitton não gostou e já está reclamando seus direitos autorais...
Bom, gosto dos argumentos da artista, vivemos um momento de intensa inversão de valores. Diariamente, vejo pessoas, que nada oferecem à sociedade, se tornarem ícones e passarem a ser idolatradas pelos meios de comunicação. (vide http://ego.globo.com/Gente/Fotos/0,,GF57246-9801,00-GALERIA+DE+FOTOS+NATALIA+CASASSOLA+GANHA+FESTA+DOS+FAS.html#fotogaleria=8 ).
No entanto, dúvidas ficam no ar: não poderia a artista ter representado a bolsa sem uma caracterização tão explícita? Não teria a campanha basicamente o mesmo apelo se tivesse apenas uma leve referência ao culto às bolsas de marca?
Sou contra a idéia de policiamento do outro. Acho que todos devem ter a plena liberdade individual assegurada. E isto se reflete na opção de escolha de seus próprios bens de consumo. Nem todo mundo que usa roupas de marca é alienado ou ignora a realidade. Alguns têm condições para investir em responsabilidade social e para bancar seus desejos. Quem somos nós para determinar aquilo que as outras pessoas devem ou não fazer? Conheço artistas que dizem que "não ligam para dinheiro", mas que, apesar do aspecto "descolado", não perdem a oportunidade de tirar vantagem dos colegas.
Acho que, no mundo, existe todo o tipo de gente e classificações quase nunca se mostram fiéis à realidade.
Bom, escrevi demais. Agora quero saber (se é que alguém leu até o final) o que vocês pensam sobre o assunto.

9 comentários:

Anônimo disse...

O pior é que toda essa discussão é de dificílima compreensão pra boa parte das pessoas. Eu mesma me pego fugindo para o mundo do entretenimento, quando me vejo impossibilitada de impedir que Jabor faça seus pré-julgamentos baseado em fundamento técnico algum. Passo o tempo mesmo com revistas de moda e desejo às vezes objetos da LV, Louboutin e cia., quando percebo que pouco posso fazer para limitar esse tipo de manipulação social (tanto nos casos de polícia, quanto nos outros). Mas, por favor, seja generosa comigo. Não me ofereça a linha de frente do campo de batalha. Isso não faz o meu perfil. Deixe-me apenas abandonar o barco, porque sou dessas que evitam problemas a qualquer custo.

Si disse...

1. Com relação ao caso Nordoni, o casal já foi condenado antes mesmo da perícia apresentar os resultados. Onde foi parar a “são inocentes até que se prove o contrário?”.
Eu, sinceramente, não suporto mais ouvir falar desse caso. É muita exploração de um assunto tão delicado.

2. Pode sim o direito de expressão sobressair sobre o direito autoral. Mas, infelizmente, as pessoas que usam bolsas Louis Vitton comprarão a camiseta para “ficar bem na fita”, serem notadas, assim como participam de manifestações contra a violência cercadas de seguranças. É a contradição de nossa sociedade (inanimada e frívola).

Beijos, moça.

anjobaldio disse...

Ôi Renata, O Búfalo da Noite comprei na LDM (Pç.da Piedade) Posso lhe emprestar se você quiser. Bjs.

anjobaldio disse...

Renata: desculpe pelo erro acima. O livro "eles eram muitos cavalos" eu comprei no sebo do João Filho. Até mais.

Anônimo disse...

Ainda não terminei de ler o livro, mas estou gostando muito.

Anônimo disse...

Renata, passei para sabê-la, às vezes por duas palavras a gente percebe sensibilidade e inteligência. Seus textos confirmam. Resumindo sobre o que li, sua posição sobre o respeito às opções de cada um, revela sua maturidade e linha de conduta diante do semelhante, tb penso assim.O q não nos tira o direito de perceber o qto são ocos os vici-ados em grifes. Sobre a mídia, tenho muitas vezes comentado, como acontecem crimes que parecem uma série, adolescente atira em uma escola, logo 3, 4 farão o mesmo, e por aí vai.Acho que o sensacio- nalismo q as notícias conferem a tais fatos tem responsabilidade nisso. Sei que à mídia cabe informar, e não sei o q poderia ser feito, mas que é preciso alguma coisa ser mudada, não há dúvida. Parabéns por ser quem é, abração, e volte a Leitura Crítica sempre.

Anônimo disse...

E agora para completar, o caso Ronaldinho... que não teria nada de especial e não seria nem vinculado na mídia, se não tivesse acontecido com o fenômeno... Este é o nosso mundo...

José Ricardo da Hora Vidal disse...

Cara Sra. B. Permita-me algumas considerações sobre este seu inteligente post: Como escritor (ou seja, seu colega de profissão), sempre defendi o direito autoral pela questão lógica: é o nosso ganha-pão! Seja o fotógrafo que publica no jornal, o autor de um poema e ou o designer de moda, ele deve receber dinheiro pela sua criação, afinal, é a recompensa de seu trabalho e o estímulo para que ele produza mais. Porém, no caso da ilustração SIMPLE LIVING, devo reconhecer que a liberdade de expressão deva prevalencer por conta do conteúdo humanitário. Os massacres de Darfur (como na Somália e no Saara Ocidental) deveriam ter mais cobertura na mídia do que a sapato novo de Paris Hilton ou superexposição do caso Nardoni. Neste ponto, abriria eu com alegria de receber meus direitos se um poema meu puder ajudar numa campanha humanitaría. Concordo contigo que a artista poderia apenas ter feito uma caricatura da bolsa de grife. Contudo, surtiria o mesmo efeito? Acho até que isso ajudaria mais para divulgar a causa que ela defende. Só que com isso não defendo que a liberdade de expressão seja usada de forma autoritária. O caso Nardoni nos mostra isso, pois o casal já foi condenado antes do julgamento. Infelizmente estamos repetindo o caso da Escola Base com a sensação de que cada vez mais o interesse comercial pela audiência superou o interesse público que, em principio, deveria nortear o jornalismo. Bem, no fundo, minha opinião é essa: a princípio, na colisão de direitos, o que deveria imperar é o interesse público e humanitário. o direito autoral e de patente deve ser defendido sim para que a sociedade possa ganhar com a criação intelectual. Todavia, se a quebra de patente significar, e.g., o salvamento de vida, então que a quebremos sem dó!
Bem, esta é a minha opinião deste vosso humilde fã, Ricardo Vidal.

José Ricardo da Hora Vidal disse...

Obrigado pela mensagen que tu me deixaste. E fico muito lisongedo em ter o meu blog figurandod entre a suas sugestões. E sempre que puder, comentarei mais amiúde seus novos posts. Um abraço fraterno e sincero