28 de dez. de 2008

Sobre inícios e fins


" Uma história não tem princípio nem fim: arbitrariamente, escolhe-se o momento vivido de onde se deve olhar para trás ou para frente. Eu digo "escolhe-se" com o orgulho de um escritor profissional que tem sido elogiado - quando observado com seriedade- pela sua habilidade técnica, mas será que, de fato, escolho aquela noite escura e úmida de janeiro no Common, em 1946, a figura de Henry Miles atravessando, inclinada, o grande rio de chuva, ou essas imagens que me escolhem?"

Graham Greene



O maior desafio do escritor é saber a hora de abandonar o passado. E, mesmo compreendendo que a literatura sempre demandará muito da menina que fui, escolho olhar para frente. Consinto o futuro, aceito os riscos da minha própria condição. Mudo de postura: passo a acreditar no humano. Somente desta forma, não terei como duvidar de mim. Fecho o Vestígios em 2008 com o início do extraordinário romance Fim de caso. Sim, finalizo com um início. Talvez, em 2009, comece com um fim. Eu e a Senhorita B. desejamos para vocês tudo de melhor para esse ano que gostamos de pensar que se inicia. Eu e a Senhorita B. desejamos tudo de melhor para vocês nesse ano que gostamos de pensar que está sendo finalizado. Voltamos no final de janeiro. Desta vez, espero que de mãos dadas.

24 de dez. de 2008

Por via das dúvidas...


Querido Papai Noel,



Eu sei... Há muito tempo que não escrevo para você. Mas vamos ser sinceros: eu tive motivos suficientes para me aborrecer. Passei todo o ano de 1990 me comportando direitinho e você apronta aquilo comigo? Ora, era muito natural que eu desejasse uma prancha de surfe. Só assim poderia ser parecida com os personagens de Top Model, minha novela preferida da época. Ah... Existia alguém com oito anos que não queria ser filho de Gaspar? Confesso que ainda hoje acho muito legal o nome de suas crias(Elvis, Ringo Starr, Jane Fonda, Olívia e Lennon). Numa ocasião, sugeri até que meus pais inventassem outro nome mais cool para mim, mas eles não acharam tal idéia tão brilhante assim... Pois então: como é que eu deveria me sentir naquele fatídico 25 de dezembro? Pedi uma prancha de surfe e ganhei uma de isopor com um tubrarão desenhado? É verdade: parecia mesmo que o senhor estava de gozação com a minha cara. Como eu poderia deslizar nas ondas e despertar a inveja dos meus primos com aquela coisa vergonhosa?

Apenas depois que cresci um pouco, compreendi: não foi culpa do senhor. Meus pais devem ter interferido na sua decisão. Sempre foram medrosos, acho que tinham horror só de pensar que eu poderia ir para alto mar. Além do mais, vamos ser francos: meus pais não são exatamente o tipo de gente que gostaria de ter filhos surfistas. Naquele tempo, acho que eles até pensavam que isto era hobby de pessoas que não gostam de estudar.

Sim, eu e meus pais crescemos. No entanto, apesar de não ter se concretizada a possibilidade de eu me tornar surfista, o medo de meus pais não foi aplacado. Todos sabem: jamais fiz escolhas fáceis. Apaixonei-me no Direito pelo seu ramo mais marginalizado: Direitos Humanos. Sim, também adoro Tributário. Mas acabei não insistindo na idéia de passar num concurso público. Para piorar, descobri que nasci para escrever literatura. E é dela que vivo, mesmo não sendo ela o meu recurso de subsistência.

Sabe, Papai Noel? Outro dia, vi na televisão uma entrevista com o John Casablancas. E, quando perguntaram para ele sobre o seu filho Julio (vocalista do Strokes), este acabou confessando: meu menino sempre foi muito excêntrico, fiquei surpreso com o seu sucesso. Confesso que achava que essa sua idéia de montar uma banda não ia resultar em nada. Até já estava separando uma parte maior do meu dinheiro para deixar de herança para ele! Na mesma hora que escutei isso, constatei: é isso que minha família pensa sobre mim. Seria muito legal se as coisas que eu faço também dessem super certo.

Pois bem: escrevo para você com o intuito de pedir desculpas. E também para pedir de Natal que tudo que venho fazendo dê bons resultados. Sim, porque tenho tanta certeza do que quero que nem consigo cogitar em desistir. Acho que minha vida perderia o sentido, sou muito identificada com meus objetivos.

Também queria pedir muita paz, saúde e alegria para todos que me rodeiam. E, principalmente, para os leitores do Vestígios. Sim, porque é o mínimo que eles merecem depois de ler uma carta tão longa.

Paro por aqui. Sua lista é grande, não quero mais incomodar. Mas espero mesmo que todos os meus pedidos sejam acatados. Caso contrário, no próximo ano, não haverá uma tentativa pública de conseguir suas desculpas. (rs)
Um beijo e um Natal cheio de trabalho,
Renata

22 de dez. de 2008

Nós fomos!



Madonna

STICKY AND SWEET

20.12.2008

18 de dez. de 2008

A segunda história


No post Nossa Senhora das Asas de Borboletas, eu revelei que três histórias, invariavelmente, tomam conta dos meus pensamentos quando estou prestes a dormir. Fosse eu psicanalista ou vidente, encontraria explicações para tal recorrente fato e as trataria como verdades absolutas. Sendo eu escritora, resta-me a possibilidade de transformar em ficção tudo aquilo que me comove ou incomoda, mesmo sabendo que não é justo atribuir à literatura o peso de ser remédio para meus males, ou mesmo, minha cura. Deixem-me, portanto, com minhas maluquices. Preciso voltar ao passado para poder contar a segunda história.

Primeiro de Janeiro de 2003. Sou convidada por Érica, uma das minhas melhores amigas, para ir na Praia do Farol da Barra. Resisto. Digo que não sou fã de areia, argumento que detesto tomar sol. Minutos depois, acabo cedendo aos seus apelos. Érica é uma pessoa extraordinária, verdadeiramente rara. Sua companhia já é um bom motivo para me fazer mudar de idéia. Além disso, sempre que posso, evito lhe dizer nãos.

Estamos sentadas numa cadeira alugada. Sinto-me irritada com a enorme quantidade de pessoas que estão na praia, resolvo levantar para dar uma caminhada. Ando alguns minutos sem planejar meu destino. De repente, surge na minha frente um menino.

Eu não me lembro do seu rosto. Mas sei que era moreno e devia ter uns quatro anos. Ele chora sem parar, me pede ajuda, diz que se perdeu da mãe. Fico preocupada: a praia está lotada. Penso em procurar a polícia. Logo depois, desisto. Decido: a melhor coisa que posso fazer é ficar parada com o menino. Em algum momento, sua mãe irá nos encontrar. Resolvo comprar para ele um picolé.

Uma hora já havia se passado. Fico preocupada: a criança me disse que era de São Paulo, desenhou na areia sua casa e família. E se ninguém aparecesse? O que eu deveria fazer? Estava começando a ficar nervosa quando escuto um grito e alguém pega a criança pela mão.

Eu não sei se consigo descrever a cena do reencontro entre a mãe e o filho. A pobre mulher tremia, estava despedaçada, ajoelhou-se na areia e agradeceu a benção alcançada. Quando se deu conta de que eu era quem tinha cuidado do menino, ela me abraçou e, com força, falou:

-Este seu ato será a medida de todos os seus próximos dias. Tenha certeza: neste ano, se inicia o melhor tempo da sua vida.

Sendo quem sou é estranho o que vou dizer. Mas é verdade: logo após essas palavras, senti-me diferente. Sim, tenho certeza: Deus também as escutou.

16 de dez. de 2008

Era uma vez a vida...


Tenho o enorme desejo de assistir a dois filmes raros. O primeiro deles é Trinta anos esta noite do Louis Malle. O segundo é Era uma vez em Tóquio do Ozu. Durante todo o ano, procurei tais raridades para locar ou comprar, mas não encontrei. Há uma cena deste filme do Ozu que foi narrada pelo João Moreira Salles no seu excelente Santiago e que nunca saiu da minha cabeça. Acho que é assim: uma personagem olha para a outra e faz a seguinte pergunta:

- A vida não é uma decepção?

Eis que esta com um grande sorriso no rosto, responde:

- Sim, é sim.

Sim, é sim.

14 de dez. de 2008

Noções de Direito


Naquela época, ele devia ter uns seis anos. Era magrinho e bem miudinho. Cotidianamente, fazia favores para todos os outros moradores da casa. Ajudava o pai a carregar sua pasta de trabalho, pegava água na cozinha para a mãe, deixava a irmã mais velha (e muito medrosa!) dormir com ele na sua cama. Só que, um dia, com ar de seriedade, convocou seus familiares para uma reunião.

- O que foi meu filho?- questionou a mãe sempre preocupada com doenças.

Ele nada respondeu. Preferiu entregar, logo de uma vez, o pequeno papel amarelo. Neste se lia:

"Nas minhas férias, não vou fazer fafores."

Sim, ele estava ainda aprendendo a ler e escrever. Mas, desde então, já sabia muito bem o que eram direitos trabalhistas.
(Gente, essa história é verdade! O menino personagem é meu irmão!)

11 de dez. de 2008

Nas minhas férias...


Pensei em tirar férias. Decidi que elas iriam começar na última segunda-feira. Mas como tudo meu que sempre irá começar na segunda-feira, nada aconteceu. Fiquei preocupada com um artigo que tenho que produzir, senti-me incomodada com o Vestígios desatualizado, pensei na morte, descobri que preciso fazer mercado. Irritei-me com tudo isso, recriminei-me por ser tão tensa e me obriguei a entrar de férias. Para criar um clima, saí ontem de sandália havaiana (ou japonesa para meu pai e Bernardo). No salão, meu cabeleleiro perguntou se eu estava com o pé doente. No cinema, encontrei com uma professora que quero que seja minha orientadora. Quase morri de tanta vergonha. Não, eu não tenho o passe livre das gringas que visitam todo o Brasil de sandália e microshorts. Não, eu não sou o tipo de pessoa que pode pensar que está de férias. Só fico feliz no primeiro minuto. Logo depois, me aborreço, pois detesto não ter o que fazer. Na infância, quando visitava a ilha, morria de tédio. Só melhorou quando descobri que minha casa de veraneio ficava defronte de uma biblioteca pública. Achava um saco toda aquela dinâmica de praia e conversas com vizinhos-que-nunca-diziam-nada. E, no início das aulas, ainda tinha que escrever uma redação mentindo sobre o meu maravilhoso verão. Que imposição social é essa de obrigar todo mundo a entrar de férias? Por que as pessoas ficam dizendo que eu sou uma menina amarela?
Não, nesse verão, eu não vou me bronzear na praia. Não, eu não vou usar um vestido leve e caminhar pela areia como se estivesse numa propaganda de Sundown. Talvez até passe o Reveillón em casa. O que vou fazer? Ainda não sei. Talvez até tire umas férias. Só para ler e escrever.

7 de dez. de 2008

Nossa Senhora das Asas de Borboletas


Quase todas as noites, naqueles instantes em que lutamos para não adormecer, três histórias, invariavelmente, tomam conta dos meus pensamentos. E, hoje, escolhi falar de uma delas. Faço isso, porque ainda não encontrei uma explicação razoável para o fascínio que ela exerce sobre mim. Faço isso, porque preciso dividir minha perplexidade, expor esta dor que ainda não conheço o nome.
Em julho deste ano, pouco antes da minha mudança, meus pais retornaram de uma longa viagem. E, enquanto eu observava minha mãe desarrumar suas malas, um pedaço de cartolina que estava entre suas roupas, chamou minha atenção. Perguntei o que era aquilo. Imediatamente, ela respondeu: era uma imagem de Nossa Senhora. Preparem-se para ouvir uma das histórias mais tristes que já escutei.
Minha mãe caminhava pelas ruas de Praga, quando foi abordada por uma mulher. Esta lhe implorou ajuda, pediu que comprasse uma das imagens que tinha nas mãos. Custaria apenas três euros. Minha mãe assentiu. E acabou adquirindo um pedaço de cartolina, onde estava representada uma Nossa Senhora. Sim, até este ponto, esta parece uma história comum, corriqueira para nossa realidade. Não fosse o fato de a imagem ter sido confeccionada pelas crianças miseráveis do deserto da África, crianças que nada tinham para comer, crianças que precisavam de forma desesperadora daquele dinheiro. Crianças que, por não terem a quem recorrer, passavam seus dias caçando borboletas e, após matá-las, retiravam suas asas para servirem de matéria prima para as imagens das santas que precisavam representar.
A fotografia acima não faz jus à imagem. Seu colorido é intenso, vibrante, vivo. E sempre que a observo sinto uma dor física, um incômodo terrível. Porque ela representa a morte, o desespero, é mistura de gritos. Porque, mesmo com tudo isso, ela possui rara beleza, é arte de primeira, dessas que é muito difícil de encontrar.
Denominei a imagem de Nossa Senhora das Asas de Borboletas. E escrevi uma pequena oração:
Nossa Senhora das Asas de Borboletas, tão cheia de beleza
Preciso dizer: uma vida não se faz apenas de perdas
E de nada adiantam palavras, ou mesmo, o sacrifício da natureza
Se os que tanto precisam não recebem o seu olhar
Nossa Senhora das Asas de Borboletas, é muito difícil estar vivo
Portanto, acabe com nossos medos
Ouça os apelos e gritos
Nossa Senhora das Asas de Brorboletas, não queremos retirar as asas dos outros
Para podermos sonhar
Um Feliz Natal para todos e um excelente 2009. Resolvi tirar férias:)

3 de dez. de 2008

O preço de cada um


Constantemente, travo com meu irmão a mesma discussão. Ele insiste em dizer que todo mundo tem um preço. Eu insisto em discordar dele. Quase sempre, nessas horas, ele me oferece dinheiro para eu fazer coisas malucas. Um exemplo? Recentemente, ele me prometeu uma boa quantia para eu abraçar com força um desconhecido na fila do cinema e falar para tal pessoa que eu a amava. Sim, fiquei tentada. Confesso: até tentei abraçar o tal estranho. Mas, na hora H, não consegui. Amarelei mesmo. Nesse dia, acabei provando, por vias tortas, a minha tese: não, nem todos têm um preço. Pelo menos, eu ainda não sei o meu.
Mas, sim, não posso negar. A fotografia acima revela que meu irmão ganhou um forte aliado para a comprovação de sua tese. Mikhail Gorbachev, garoto propaganda da Louis Vuitton? Ops! Ele não tinha morrido? Ops! Qual terá sido o seu preço?

1 de dez. de 2008

Perdendo pessoas


O melhor final para ela era aquele em que todos morrem. Pois a morte de todos significava mistura de perfumes e acabava tendo um cheiro doce: lágrimas não existiriam para salgar tal odor. Além disso, ela pensava que apenas assim poderiam ficar eternamente juntos. Sim, sempre foi dada à ilusões. Mas de que mesmo, fora carnes, é feito o humano? Com a mala cheia de medos, ela guarda suas dores no corpo. E consente fugir para um lugar remoto onde o mundo é como deveria ser. Para não perder pessoas porque não quer escadas no escuro descer. Todos felizes, numa fotografia distante. É o que leva no bolso a Senhorita B.

27 de nov. de 2008

Senhorita Bebê


Promessa cumprida!

26 de nov. de 2008

Vestígios 2


Haverá uma segunda exibição do curta Vestígios da Senhorita B. no dia 02 de dezembro, às 20:00 horas, na sala Alexandre Robatto.

23 de nov. de 2008

Sem fim



Se existisse inferno, eles já o conheciam: o Reino da Caverna dos Dragões. A história do desenho, num primeiro momento, parece simplória: seis crianças, após entrarem num determinado brinquedo de um Parque de Diversões, acabam sendo aprisionadas numa outra e terrível dimensão. A partir disso, com a ajuda de um anão intitulado Mestre dos Magos, elas são obrigadas a lutar por sua sobrevivência e têm como principal inimigo o Vingador, a própria encarnação das Trevas. Não, este não é um desenho qualquer. Deixe-me explicar o porquê.

Passamos toda a nossa existência em busca de algo. Amor, dinheiro, sucesso, beleza e felicidade são apenas variações do Parque de Diversões que os meninos perdidos tanto procuravam. Durante todos os episódios, eles se dedicavam a encontrar a saída daquele mundo terrível, mas, da mesma forma que acontece na realidade, eles jamais conseguiram atingir o seu objetivo.

Não há outra alternativa senão viver aquilo que se apresenta diante de nós. E, sim, nossos paraísos são meras ficções. O maior de todos os tesouros é o consentimento de nossa própria condição humana. E da solidão que, invariavelmente, nos acometerá.

Sozinhos, jogados num mundo louco sem qualquer explicação. Alguma semelhança? Já me disseram que, no capítulo final do Caverna do Dragão, os meninos descobrem que nunca voltarão para casa, pois estão mortos e aquele lugar era o fim. Desenho animado para criança? Bom, acho que não é bem assim.

21 de nov. de 2008

A paixão segundo G.H.

"É difícil perder-se. É tão difícil que provavelmente arrumarei depressa um modo de me achar, mesmo que achar-me seja de novo a mentira de que vivo, Até agora achar-me era já ter uma idéia de pessoa e nela me engastar: nessa pessoa organizada eu me encarnava, e nem mesmo sentia o grande esforço de construção que era viver. A idéia que eu fazia de pessoa vinha de minha terceira perna, daquela que me plantava no chão. Mas e agora? estarei mais livre?"

Clarice Lispector

18 de nov. de 2008

Meus queridos e-amigos,


Há dias em que, apesar do céu nublado, recebemos nas nossas portas alguns belos presentes. Hoje não é meu aniversário(o dia é 13 de março, não esqueçam!), mas acabei ganhando dois.
O primeiro deles me foi dado pela Kátia Borges e pela Gerana Damulakis. É o “Prêmio Dardos”. O selo foi criado para promover a confraternização entre os blogueiros. Quem recebe e aceita deve exibir a imagem do selo, linkar o blog do qual recebeu o selo e escolher outros 15 blogues.


O segundo presente está lá no Notícias do Interior para todo mundo ver.
Pois é: no ciberespaço não tem tempo nublado. Com os e-amigos que tenho só pode ser assim.

17 de nov. de 2008

Da nossa poesia de cada dia


Sem qualquer motivo, acordei estupidamente nervosa hoje. Entrei num ônibus vazio, mas, diferente do meu usual comportamento, preferi me sentar ao lado de uma mulher. Ela me lançou um leve sorriso. Percebi: cinquenta e poucos anos, cabelos claros, vestido preto, colar de pérolas. Fones de ouvido. Sinatra. Minutos depois, em lindos vestidos de gala, bailávamos com nossos amores pelo mais belo salão de New York.

15 de nov. de 2008

Um Estado de Fracos


Vivemos num Estado de Fracos. Ontem, esta foi minha constatação ao escutar a história de um conhecido. Jovem e muito entusiasmado, ele conseguiu entrar no Mestrado da Universidade mais prestigiada do país. Professor de Direito de outra instituição, ao ver no site desta que os currículos de seus colegas continham informações sobre suas formações acadêmicas, requereu à secretaria do curso que colocasse na sua biografia a sua titulação. Dias depois, ao entrar novamente no site, descobriu que todos os currículos já não mais mencionavam as Universidades nas quais os professores tinham completado sua formação. A explicação para isso? Este meu conhecido havia deixado os colegas numa situação difícil, pois ele era oriundo de um lugar com muito mais reconhecimento e isso incomodava os outros docentes. Portanto, para não ocorrer desentendimentos, a secretaria achou por bem não mais fornecer tal tipo de informação.

Bem vindos ao Brasil: um país que não desculpa aqueles que são bem sucedidos. Ou melhor: um país hipócrita que se vale da roupa da humildade para relativizar os méritos daqueles que realizam seus sonhos e objetivos.

No Brasil, costuma-se adotar um discurso desprendido, critica-se qualquer um que tenha dinheiro. Utilizando-se de uma lógica excludente, o "povo brasileiro" atribui a culpa de sua pobreza a qualquer um que tenha mais recursos. Como se estes fossem os únicos e verdadeiros responsáveis por sua desgraça. Como se estes tivessem que carregar nas costas uma cruz por terem tido força suficiente para seguir em frente. É claro que existem empresários terríveis e inescrupulosos. Mas será que todos no mundo só concretizaram seus objetivos pisando nos outros? Claro que não! Outra coisa: se somos tão desprendidos, se consideramos o dinheiro como algo supérfluo, " coisa de americano", por que nos preocupamos tanto com isso?

No Brasil, se você consegue ter uma boa formação acadêmica, ao invés de ter seus méritos reconhecidos, escutará alguém relativizar sua conquista. Sempre terá alguém que dirá que tal pessoa " estudou porque podia" ou que "grandes coisas isso, vai virar um desses idiotas que nada conhece da vida". Sim, é verdade, sabemos o quão esse discurso é vazio. Mas o problema é que sentimos muita pena desses fracos, somos paternalistas, fingimos acreditar no que eles dizem.

Recentemente, uma pessoa me falou que o Exame de Ordem era um absurdo, já tinha prestado quatro vezes e perdido. Na mesma hora, respondi: quando você estudar direito irá passar. Devo ter sido considerada antipática, mas o que eu deveria fazer? Negar a importância do exame? Ser solidária à ignorância alheia? Desconhecer o mérito daqueles que se esforçaram e conseguiram passar?

No Brasil, se você é uma pessoa considerada bonita deve entender como naturais abusos de todos os tipos. Isso inclui grosserias masculinas e situações muito desagradáveis. Sim, sabemos que tudo é fruto de uma "inveja institucional", já irraigada. Mas por que mesmo fechamos os olhos para isso e ficamos desculpando estes outros tão preconceituosos? Se reclamamos tanto da impunidade que toma conta do país, por que agimos da mesma forma na nossa esfera privada?

Tenho uma teoria: somos muito narcisistas. Gostamos de parecer superiores e, ao mesmo tempo, humildes. Por isso, não colocamos ordem na casa. Por isso, acabamos nos nivelando com aqueles que tanto desprezamos: os fracos.

Bem vindos ao país onde ninguém liga para dinheiro, onde não é bom estudar, ser inteligente ou bonito. Bem vindos. Mas não esqueçam de trazer suas máscaras. Senão nesta festa vocês não irão entrar.

12 de nov. de 2008

Culpa de Eva e minha mãe



Sendo eu extremamente alérgica à esmalte e tendo achado linda a edição limitada da Risqué, resolvi comprar dois da cor Havana para dar de presente para Eva e minha mãe. É verdade: sou uma filha e amiga muito generosa.

Minutos depois, estando eu muito próxima do salão de beleza, resolvi parar para conversar com minha manicure, pessoa por quem nutro enorme carinho. Logo depois, para não perder a viagem, achei por bem fazer as unhas.

Considerando o fato de que eu estava sem os meus esmaltes hipoalergênicos, sugeri que ela pintasse as minhas unhas de Havana, pois, por pura coincidência, eu tinha dois na bolsa. Aterrorizada, ela disse que não iria fazer isto de jeito nenhum, jamais seria cúmplice da minha desgraça. Mas, após pintar minhas unhas com uma camada do seu hipoalergênico muito sem graça, ela se sentiu bastante comovida com a minha situação. Sabe, Lu? Ando me sentindo muito feia, tenho saudades da minha família, é muito difícil viver numa cidade tão distante... Seria tão bom colocar uma cor na minha vida!

Tá bom, Dona Renata... Vou colocar um pouco do Havana! Vou tentar não encostar na pele, só um pouquinho não deve fazer mal.

Tendo eu não dormido na noite passada por conta de uma alergia inesperada, que me deixou com as pálpebras inchadas e avermelhadas, machucou meu nariz e ressecou minha garganta, ainda no meio da madrugada, injustamente, fui obrigada a escutar:

-Renata, você pintou suas unhas com algum outro esmalte?

-Como assim, amor?

-Não minta. Eu escutei você falando para sua mãe que comprou um esmalte para ela. Me responda: você usou o bendito esmalte?

- O universo e suas coincidências acabaram me obrigando! Além do mais, ando me sentindo muito feia, com saudades da minha família... Pintei para ficar bonita para você.

- Francamente! Deixe as suas histórias para o Vestígios da Senhorita B.

10 de nov. de 2008

Estréia do curta Vestígios da Senhorita B



Um vestido, uma cama, um livro. Vestígios? Alguém que foge sem que se saiba o porquê. Sim, este é o principal mote do curta-metragem Vestígios da Senhorita B.
Um dos vértices do Triângulos do Real, projeto concebido pela escritora Renata Belmonte (também roteirista, atriz e produtora do curta-metragem), o filme Vestígios da Senhorita B. busca recontar através de imagens uma história sobre o tempo. Apenas cinco minutos são o suficiente para se falar de tal tema tão precioso? Ora, morre-se muito durante tal breve lapso temporal.
Dirigido por Franklin Albuquerque, o Vestígios da Senhorita B. foi realizado na cidade de Salvador em Janeiro de 2008, tendo sido a Sala do Coro do Teatro Castro Alves e o restaurante Chez Bernard suas locações. No elenco, destaca-se a presença de Rosalva Leal Conceição, avó de Renata Belmonte, que divide com a neta a função de personagem oráculo do trabalho.
Tal curta-metragem, em conjunto com o blog e o livro de mesmo nome, conta uma história que todos intimamente já devem conhecer. Qual? Sejam bem-vindos ao mundo da Senhorita B.


Meu curta, o Vestígios da Senhorita B. , será exibido no dia 14 de novembro às 16:00 horas na sala Walter da Silveira/Alexandre Robatto. Ele faz parte do Panorama Nacional da 12ª edição do Festival 5 Minutos. E, um dia antes, às 15:00, no mesmo local, vocês podem conferir o filme do querido Nelson Magalhães Filho. (com roteiro também de Pablo Sales, outro grande amigo).
PS: Queridos, ironicamente, é muito pouco provável que eu esteja presente. Mas minha avó com certeza estará. Bjs para todos!

7 de nov. de 2008

Antevasin


Desde que me reconheço como gente, tenho a sensação de que não há lugar para mim neste mundo. E tal situação sempre me gerou um extremo desconforto. Sim, é verdade: sou absurdamente amada e isso atenua minha sensação de pária. Mas não posso deixar de perceber que nunca me senti exatamente identificada com as pessoas ou coisas que me cercam. Quando eu era criança, detestava tal condição, queria me sentar na mesa dos adultos. Só que lá também não encontrava o que desejava, pois ficava evidente que aquele espaço não me oferecia o que tanto eu buscava. Sempre fui estrangeira na Bahia, ser excêntrico nas festas de família. Extremamente libertária para uns, conservadora ao máximo para outros. E, desde que mudei de cidade, percebo com ainda mais clareza esse olhar do outro. Provoco estranheza por não ser aquilo que todos esperam de mim.

Muito pior do que não ser aquilo que se espera é não encontrar aqueles que espero. Ressalto que adoro a maioria das pessoas que conheço. Meu problema é que não consigo me comunicar, parece que falo outra língua, nunca sou compreendida. E nisso consiste minha grande solidão. A impossibilidade de ser parte de um grupo me impede de dividir com outro tudo aquilo que me é caro.

Gostar de muitas coisas, transitar entre espaços distintos, sem jamais pertencer a nenhum deles é minha marca pessoal. Meses atrás, minha mãe, conhecedora dessa minha insatisfação, me deu de presente um desses bestsellers místicos. Insistiu que eu deixasse de lado meu preconceito e que fizesse a leitura, assegurou que me faria bem. Tinha razão. Num determinado momento do livro, a autora, dona de uma angústia próxima da minha, descobre uma palavra em sânscrito que a define: Antevasin. A partir disso, sente-se parte de algo, inscreve-se na vida, encontra alguma paz.

Antevasin significa aquele que habita a fronteira e que, de onde se encontra, consegue ver vários mundos. Fronteira. Sim, talvez esse seja também o meu lugar.

5 de nov. de 2008

Go Obama!




Estive em Nova Iorque em agosto de 2007 e setembro deste ano. E, apesar do curto espaço temporal entre as duas viagens, pude perceber com clareza a enorme crise que se abateu sobre os Eua. Não falo unicamente da situação financeira. Trato do maior desafio do país: aceitar a alteridade como única forma possível de construção de uma nação melhor.
A eleição de Obama é o primeiro passo para a concretização desse ideal. Jamais imaginei ver um negro eleito para a presidência dos Eua. No racismo de origem, a segregação racial é notória, terrível. Fico encantada com esse homem que, apesar de todas as dificuldades, acreditou em si mesmo e foi se capacitar, algo que considero primordial para o exercício de qualquer profissão.
Obama não foi eleito por causa de um discurso de vitimização ou qualquer coisa do tipo. Obama foi eleito porque é um homem competente, preparado, carismático. Seu discurso não visa destruir ou ampliar dicotomias, mas, sim, o respeito às escolhas de cada um.
Sempre detestei política. Mas, pela primeira vez, apesar de não ser americana, me senti verdadeiramente representada. Sei que Obama é apenas um homem e não um candidato ao posto de santo. Posso me decepcionar. Mesmo assim, deixo aqui registrada a minha alegria no dia de hoje.

3 de nov. de 2008

Porque recordar é viver...

Vilda, viu que certas coisas só têm graça com você?

31 de out. de 2008

Senhoras e senhoritas,


Vamos combinar de ir para praça queimar uns sutiãs?
(Como já disse o André Leones, a Sarah Palin só pode ser algum novo personagem do Woody Allen...)

28 de out. de 2008

J, filho de M


Vocês se lembram daquela frase que aprendemos aos doze anos e que ficávamos repetindo no playground sem parar? Aquela que proclama: "o que vem de baixo não me atinge". Pois então: eu a internalizei com perfeição. Talvez pelos dez anos de análise. Talvez porque, na infância, como vocês perceberão, eu acreditava piamente em tudo que me era dito.

Recentemente, minha querida amiga Aeronauta, me pediu que eu escrevesse sobre quando eu era criança. Pois bem, acabei me lembrando que eu era uma menina muito medrosa. E me recordei de dois episódios que foram verdadeiras exceções ao "o que vem de baixo não me atinge."

O primeiro deles se deu num conhecido restaurante de Salvador. Eu, aos quatro anos, tinha verdadeiro pavor da criatura que abria a porta dele. Isso mesmo: o monstro da minha infância era o anão do Baby Beef.

Ele era(é?) um homenzinho muito, muito pequenininho. E, bem mais terrível do que ter que ver aquele anão todo domingo, era a pressão que os adultos faziam para que eu fosse brincar com ele. Sempre petrificada de horror, sentava na cadeira de couro e observava as outras crianças correndo felizes, pertubando a vida daquele pobre ser. E, certo dia, uma delas, descobrindo meu desespero, afirmou: o anão lhe lançou uma maldição. Você ficará como ele, jamais crescerá.

Pronto. Isso foi o bastante para que eu começasse a chorar compulsivamente. Era louca para ser adulta e, agora, descobria que aquela criatura miserável iria impedir isso de acontecer! Foram longas as noites de medo e muitos pedidos para Deus. Até hoje, evito almoçar naquele lugar.

Mas é o segundo episódio que mais quero contar. Aos seis anos, gostava muito de ficar na casa da minha avó. E, certo dia, entro na sala de jantar e vejo minha mãe, minha avó e minhas três tias, arrasadas, repetindo sem parar: Ohhhh, J, filho de M? Drogado? Que coisa terrível!

O clima era realmente bastante fúnebre. Uma das minhas tias tinha lágrimas ns olhos. Compreendi que ser drogado era algo muito ruim, quase como ser um vampiro. Mas não sabia exatamente o que tal palavra significava. Lembro-me ainda com perfeição de minha mãe falando: Mas que desgraça se abateu sobre essa família! Renata, minha filha, não aceite nada que J. queira lhe dar.

J, filho de M, era um bonito adolescente que morava no prédio de minha avó. Com alguma frequência, brincava comigo, adorava crianças. Recordo-me do calafrio que senti ao pensar nisso. Que perigo! Nunca, nunca mais deixaria J se aproximar.

Pois então. Alguns meses se passaram. E, numa tarde, desci para o play do prédio de minha avó para esperar meu pai me buscar. Minha avó desceria em alguns instantes, iria para um chá de cozinha, estava toda arrumada, vestia meia-calça e usava um sapato alto para mascarar sua baixa estatura.

Eu aguardava, alegremente, a chegada de meu pai. Brincava com minha boneca favorita. Mas eis que, de repente, escuto uma voz chamar meu nome. Olho para trás. Congelo. J, filho de M, está vindo na minha direção.

Horrorizada, tenho pouco tempo para pensar. Vejo minha avó saindo do elevador. Não tenho outra alternativa. Corro em alta velocidade, pulo em cima dela. Segundos depois, caímos juntas no chão.

Minha avó, com a meia calça rasgada, muito irritada. J., ajudando-a a se levantar, rindo sem entender nada. Minha avó desistindo de ir ao chá de cozinha. Meu pai, aborrecido: essa menina está mesmo muito mal-educada! Eu, de castigo, sem compreender o motivo disso. Minha avó, agradecendo: obrigada, J. Você é um bom menino.

O que vem de baixo não me atinge? Sei mais não. Escrevendo esse texto, voltei a ficar com raiva de J., do anão, mas, principalmente, de minha avó e meus pais.

25 de out. de 2008

Como Femininamente se tornou um livro raro


Há algum tempo, descobri que apenas tenho cinco exemplares do Femininamente. E isso se deve, em parte, ao fato de que tenho uma legião de leitoras bonitas e jovens. Sim, queridos, as afirmações anteriores podem induzir à falsa idéia de que faço muito sucesso e que ganhei dinheiro com meu livro. Mas, não, eu garanto: não foi nada disso.

Deixem-me contar essa história.

Quando fui premiada pela Braskem, recebi trezentos exemplares do Femininamente e os coloquei no depósito lá de casa. Tudo bem. Durante os meses (e anos!) seguintes à publicação do livro, recebi e-mails muito bonitos sobre ele, em certas situações, fui tratada com extrema distinção por garotas que nunca havia conhecido. Devo ressaltar que ficava muito surpresa com isso, pois essas minhas leitoras eram muito novinhas e não pertenciam à área de Letras. Constantemente, eu pensava: de fato, essas matérias que a imprensa faz comigo têm dado resultado. A Casa de Palavras (minha editora) deve estar vendendo um monte de livros.

Grande engano. Pois bem. Vamos à verdade:

Noite. Estou em casa, na sala de televisão. Vejo meu irmão todo perfumado saindo do seu quarto. Constato: vai se encontrar com alguma mulher. Ele me diz adeus e segue na direção da porta. Mas, de repente, percebo: ele leva algo familiar nas mãos.
- Ricardo, o que significa isso?

Ele, muito cara de pau: - Isso o quê?

- Esse Femininamente que está nas suas mãos!

Pois foi aí que descobri a origem das minhas leitoras novinhas e bonitas. Para fazer um tipo, ele furtava meus livros do depósito e dava para as meninas de presente! E sabe o que é pior? Sua tática sempre funcionava!

No depósito, poucos eram os Femininamente. Hoje, meu irmão tem uma namorada muito legal, adoro minha cunhada. E, outro dia, ela me dise: Rê, sabia que não tenho nada seu? Foi a partir disso que compreendi duas coisas. Sim, meu irmão está verdadeiramente apaixonado. E coitado do meu próximo livro. Perdeu seu melhor divulgador.

23 de out. de 2008

Mc Topic da Alegria


Um pouco mais da metade da década de noventa. O início da minha adolescência. O tão desejado fim da minha infância. Trilha sonora? Música grunge (E, sim, apesar da vergonha, vou admitir: um pouco de Gera Samba. Não esqueçam: eu era uma adolescente baiana!). Uma nova escola, esperanças renovadas? Já devo ter dito que só comecei a entender o sentido da palavra felicidade na faculdade. Mas devo justiça: na Topic da Alegria fui também feliz.

Eu morava muito longe da nova escola. Portanto, meus pais contrataram uma Topic para me levar. Mal eu sabia que aquela idéia que eu tanto rejeitava se tornaria a melhor lembrança que guardo daqueles tempos.

Sempre fui uma menina considerada madura, equilibrada. Vivia enfiada nos livros. Talvez por não ter convivido com outras crianças, achava besta qualquer brincadeira. Mas, no primeiro dia do transporte, fui apresentada para Manuela, Claudia, Patty Beijo, Mariana, Pedro Bó e Bigodeira(outro dia conto sua história), dentre outros. E isso mudou de forma radical a concepção que eu tinha sobre mim mesma.

Logo na primeira semana, Claudia retirou os plásticos que cobriam os bancos e sugeriu que colocássemos na cabeça. Para que? Ela havia colado nos vidros o seguinte aviso: Instituto Pestalozzi (ou algo do tipo, não me lembro exatamente). Num primeiro momento, me recusei a entrar na brincadeira. No entanto, minutos depois, estávamos todos, sem exceção, com os plásticos na cabeça e nos batendo contra os vidros. Os motoristas dos outros carros olhavam aterrorizados. O motorista da Topic (Bateggs) ameaçou ligar para nossos pais. Sim, talvez fóssemos mesmo retardados (sorry, pessoas politicamente corretas). Mas eu nunca havia me divertido tanto na vida.

Quantas vezes Mariana ameaçou com um isqueiro colocar fogo na Topic caso o motorista não nos levasse para Mc Donald's? Cometemos muitos sequestros! Quando não tínhamos grana suficiente, Claudia saía cantando de mesa em mesa para recolher dinheiro. E, apesar de algum constrangimento, acabava tudo valendo a pena, nosso lanche sempre era garantido.

Muitos foram os bons momentos. Mas os anos passaram e cada um foi para seu lado. Não sei o que aconteceu com Bigodeira. Patty Beijo virou uma boa médica. Pedro Bó é advogado. Cláudia, hoje em dia, é Claudia Leitte. Mariana se tornou uma respeitável analista de sistemas e, segundo eu soube, é leitora deste blog.

Algumas promessas daquela época, todas muito ingênuas, não se cumpriram. Anos atrás, no pátio da faculdade, encontrei com Pedro Bó. Conversamos rapidamente sobre o passado. Senti saudade daquela que fui. Não, eu não tenho fotografias da Topic da Alegria. Não, não sou a mesma de tempos atrás. Mas, como consolo, ainda restam palavras e sonhos para mim.

21 de out. de 2008

Uma questão de gênero

Feminicídio ao vivo – o que nos clama Eloá

Maria Dolores de Brito Mota - Socióloga, professora da Universidade Federal dp Ceará

Maria da Penha Maia Fernandes – Inspiradora da lei Maria da penha 11340 e Coordenadora de Honra da Coordenadoria da Mulher da Prefeitura Municipal de Fortaleza.

Tudo o que o Brasil acompanhou com pesar no drama de Eloá, em suas cem horas de suplício em cadeia nacional, não pode ser visto apenas como resultado de um ato desesperado de um rapaz desequilibrado por causa de uma intensa ou incontrolada paixão. É uma expressão perversa de um tipo de dominação masculina ainda fortemente cravada na cultura brasileira. No Brasil, foram os movimentos feministas que iniciaram nos anos de 1970, as denúncias, mobilização e enfrentamento da violência de gênero contra as mulheres que se materializava nos crimes cometidos por homens contra suas parceiras amorosas. Naquele período ainda estava em vigor o instituto da defesa da honra, e desenvolveram-se ações de movimentos feministas e democráticas pela punição aos assassinos de mulheres. A alegação da defesa da honra era então justificativa para muitos crimes contra mulheres, mas no contexto de reorganização social para a conquista da democracia no país e do surgimento de movimentos feministas, este tema vai emergir como questão pública, política, a ser enfrentada pela sociedade por ferir a cidadania e os direitos humanos das mulheres. O assassinato de Ângela Diniz em dezembro de 1976, por seu namorado Doca Street, foi o acontecimento desencadeador de uma reação generalizada contra a absolvição do criminoso em primeira instância, sob alegação de que o crime foi uma reação pela defesa da "honra". Na verdade, as circunstâncias mostravam um crime bárbaro motivado pela determinação da vítima em acabar com o relacionamento amoroso e a inconformidade do assassino com este fim. Essa decisão da justiça revoltou parcelas significativas da sociedade cuja pressão levou a um novo julgamento em 1979 que condenou o assassino. Outro crime emblemático foi o assassinato de Eliane de Grammont pelo seu ex-marido Lindomar Castilho em março de 1981. Crimes que motivaram a campanha "quem ama não mata".
Agora, após três décadas, o Brasil assistiu ao vivo, testemunhando, o assassinato de uma adolescente de 15 anos por um ex-namorado inconformado com o fim do relacionamento. Um relacionamento que ele mesmo tomou a iniciativa de acabar por ciúmes, e que Eloá não quis reatar. O assassino, durante 100 horas manteve Eloá e uma amiga em cárcere privado, bateu na vitima, acusou, expôs, coagiu e por fim martirizou o seu corpo com um tiro na virilha, local de representação da identidade sexual, e na cabeça, local de representação da identidade individual. Um crime onde não apenas a vida de um corpo foi assassinada, mas o significado que carrega – o feminino. Um crime do patriarcado que se sustenta no controle do corpo, da vontade e da capacidade punitiva sobre as mulheres pelos homens. O feminicídio é um crime de ódio, realizado sempre com crueldade, como o "extremo de um continuum de terror anti-feminino", incluindo várias formas de violência como sofreu Eloá, xingamentos, desconfiança, acusações, agressões físicas, até alcançar o nível da morte pública. O que o seu assassino quis mostrar a todas/os nós? Que como homem tinha o controle do corpo de Eloá e que como homem lhe era superior? Ao perceber Eloá como sujeito autônomo, sentiu-se traído, no que atribuía a ela como mulher (a submissão ao seu desejo), e no que atribuía a si como homem (o poder sobre ela – base de sua virilidade). Assim o feminicídio é um crime de poder, é um crime político. Juridicamente é um crime hediondo, triplamente qualificado: motivo fútil, sem condições de defesa da vítima, premeditado.
Se antes esses crimes aconteciam nas alcovas, nos silêncios das madrugadas, estão agora acontecendo em espaços públicos, shoppings, estabelecimentos comerciais, e agora na mídia. Para Laura Segato[i] é necessário retirar os crimes contra mulheres da classificação de homicídios, nomeando-os de feminicídio e demarcar frente aos meios de comunicação esse universo dos crimes do patriarcado. Esse é o caminho para os estudos e as ações de denúncia e de enfrentamento para as formas de violência de gênero contra as mulheres.
Muita coisa já se avançou no Brasil na direção da garantia dos direitos humanos das mulheres e da equidade de gênero, como a criação das Delegacias de Apoio às Mulheres – DEAMs, que hoje somam 339 no país, o surgimento de 71 casas abrigo, além de inúmeros núcleos e centros de apoio que prestam atendimento e orientação às mulheres vítimas, realizando trabalho de denúncia e conscientização social para o combate e prevenção dessa violência, além de um trabalho de apoio psicológico e resgate pessoal das vítimas. Também ocorreram mudanças no Código Penal como a retirada do termo "mulher honesta" e a adoção da pena de prisão para agressores de mulheres, em substituição às cestas básicas. A criação da Lei 11.340, a Lei Maria da Penha, para o enfrentamento da violência doméstica contra as mulheres.
Mas, ainda assim as violências e o feminicídio continuam a acontecer. Vejamos o exemplo do Estado do Ceará: em 2007, 116 mulheres foram vítimas de assassinato no Ceará; em 2006, 135 casos foram registrados; em 2005, 118 mortes e em 2004, mais 105 casos[ii]. As mulheres estão num caminho de construção de direitos e de autonomia, mas a instituição do patriarcado continua a persistir como forma de estruturação de sujeitos. É preciso que toda a sociedade se mobilize para desmontar os valores e as práticas que sustentam essa dominação masculina, transformando mentalidades, desmontando as estruturas profundas que persistem no imaginário social apesar das mudanças que já praticamos na realidade cotidiana. O comandante da ação policial de resgate de Eloá declarou que não atirou no agressor por se tratar de "um jovem em crise amorosa", num reconhecimento ao seu sofrer. E o sofrer de Eloá? Por que não foi compreendida empaticamente a sua angústia e sua vontade (e direito) de ser livremente feliz?

[i] SEGATO, Rita Laura. Que és um feminicídio. Notas para um debate emergente. Serie Antropologia, N. 401. Brasília: UNB, 2006.
[ii] Dados disponíveis em: http://www.patriciagalvao.org.br/apc-aa-patriciagalvao/home/noticias.shtml?x=1076

19 de out. de 2008

Sobre o melhor dos vestidos


"Nada é mais belo que um corpo nu. A roupa mais bonita para vestir uma mulher são os braços do homem que ela ama. Para as que não tiveram essa felicidade, aqui estou eu."

Yves Saint Laurent

16 de out. de 2008

Sobre noites


Caminhando por lugares muito conhecidos que sempre, apesar de tudo, serão seus. Reconhecendo-se em cada pequeno canto, encontrando alegrias nessas redescobertas. Não, não havia abandonado ou perdido nada. As mesmas pessoas com suas vidas na mesma. Algumas belas, encantadoras. Outras menores, mas a distância traz uma certa piedade. Os cheiros que pensava esquecidos, os monstros criados, agora, motivos de zombaria. Num breve lampejo de saudade, Cecília sussurra no seu ouvido: Não tem mais lar aquele que mora em tudo. Novamente, fugitiva, muito longe do mar. Melhor assim.

12 de out. de 2008

Serial Killer


Eu não sei porque, mas existem pessoas que eu sempre penso que já estão mortas, apesar delas permanecerem bastante vivas. Com o intuito de finalmente me convencer de tal informação, resolvi elaborar e publicar uma lista com o nome dessas pessoas. São elas:

1- J.J Canotilho (pessoas do Direito, podem rir da minha cara).

2- Morrissey

3- Boy George

4- Twiggy

5- Mikhail Gorbachev

6- Djalma, amigo de infância de meu pai.

7- Cristiane F

8- Qualquer filósofo que é citado no mestrado.

10 de out. de 2008

Ema, ema...


Sabe aquela rima: ema, ema, não me conte seus problemas? Pois então: ela não se aplica para mim. Sim, porque eu adoro escutar os problemas dos outros. Sério! Sou assim, desde pequena.

Alguns de vocês, os que me conhecem pessoalmente, sabem que não sou exatamente uma pessoa silenciosa. Muito pelo contrário. Adoro falar, meu pai costuma dizer que, dois minutos comigo no elevador, são suficientes para que eu fique íntima das pessoas. E é verdade, isso faz parte do meu temperamento. Recentemente, fui a primeira pessoa a saber que uma conhecida iria pedir o divórcio. Antes mesmo do marido dela. Ela me encontrou na farmácia e relatou suas angústias durante horas. Pediu conselhos, chorou. Dois meses depois, quando minha mãe veio me contar a "bomba", eu já até achava que a tal conhecida tinha se casado novamente...

Tudo isso é muito curioso porque gente que mal me conhece se confessa para mim. Sim, é verdade: ao contrário da maioria das pessoas falantes que conheço, eu sou uma ótima ouvinte. E na minha vasta carreira de testemunha dos problemas alheios, já escutei histórias e confissões de corar as faces da Madonna.

Sou assim e gosto desta minha característica. E escrevi este post porque acabei me dando conta que o Vestígios deixou de ser um blog voltado para a literatura, tornou-se mais um espaço de amigos, onde escrevo e escuto o que vocês, queridos, têm para dizer. E sabem de uma coisa? Fico feliz com isso. Porque minha literatura também cumpre seu destino principal: vira logo livro.

8 de out. de 2008

O pior emprego do mundo


Eu já devo ter dito para vocês que odeio festas. E, quando falo em festas, refiro-me a um tipo de evento social que obriga as pessoas a parecerem chiques e super felizes o tempo todo. É óbvio que eu adoro ir para os casamentos e aniversários de amigos queridos, vou com prazer. O que eu acho insuportável é o ritual da melancolia: gente plástica dançando músicas sem graça, conversas tolas que não agregam nada, champagne Vive Clicot para alimentar maledicências e mentiras sobre tudo e todos e comentários indiscretos sobre a vida financeira alheia. Recentemente, ainda durante uma cerimônia religiosa, escutei um rapaz (primo da noiva!!!) dizer que "não sabia porque tinha ido para aquela festa, pois só havia mulher bizarra." Isto mesmo. Falta de respeito? Imagine!

Pois então: ontem, após escrever parte de um artigo sobre o Gender Gap(Índice de Desigualdade entre Gêneros), resolvi descansar e liguei a televisão. E, zapeando com o controle, me deparei com o mais assustador filme de terror: o programa do Amaury Júnior. Visualizem a cena: um monte de mulheres lotadas de jóias e super parecidas com a Cher (mas sem a graça dela) fingindo que não sabiam que estavam sendo filmadas. Todas rindo e dançando no ritmo do nada. Homens de idade com suas "esposas"(meninas loiras com no máximo 18 anos, sério!). Todos meio bêbados, oleosos, contando vantagens, deixando claro o poder do dinheiro. Olacyr de Moraes, acompanhado por duas garotinhas, mostrando que ter muita idade não é sinônimo de sabedoria. Não, não é preconceito. Sempre achei o Hugh Hefner um cara bacana, acho que ele gosta mesmo de suas três namoradas. Mas o Olacyr estava visivelmente determinado a aparecer, as meninas eram meio, não fim.

Como gosto de me magoar (isso é sadomasoquismo: incômodo misturado com prazer), continuei assistindo. E aí, apareceu o Carlos Alberto da Nóbrega (da Praça é Nossa!) e sua mulher. Amaury perguntou porque eles tinham se separado. Carlos Alberto, prontamente, repondeu: não aceito mulher que trabalha, tenho muito ciúme e ela inventou que queria trabalhar.
Depois disso, resolvi desligar a televisão. Pois tudo havia ficado muito claro: é por essas coisas que, ainda nos dias atuais, no Brasil, as mulheres apenas têm acesso a 66,37% de todos os recursos e oportunidades que estão disponíveis para os homens.
Sim, o Amaury merece todo o dinheiro que ganha. Porque ele, na minha opinião, tem o pior emprego do mundo.
(Achei uma outra entrevista do casal Nóbrega para o Amaury: http://br.youtube.com/watch?v=Uyt8Vfd-2fQ&feature=related. Não deixem de assistir!)

7 de out. de 2008

Semelhanças


Neste vasto mundo, somente eu acho a Sofia Coppola muito parecida com a Clarice?

4 de out. de 2008

Repensando conceitos 2



Sempre me pergunto: como ele conseguiu fazer o que fez em pleno século XX?

Repensando conceitos I

Comentário proferido por um famoso pensador na ocasião da guerra entre os EUA e o México pelo território da Califórnia:
"É uma infelicidade se a rica Califórnia foi arrancada dos mexicanos preguiçosos que não sabiam o que fazer dela? Se os enérgicos yankees, graças a exploração das minas de ouro daquela região, aumentam as vias de comunicação, concentram sobre a costa do Pacífico uma população densa e um comércio em expansão, abrem linhas marítimas, estabelecem uma via férrea de Nova York a São Francisco, abrem pela primeira vez o Pacífico à civilização e pela terceira vez na história dão uma nova orientação ao comércio mundial?“Será que é falta de sorte que a magnífica Califórnia tenha sido tomada dos preguiçosos mexicanos que não sabiam o que fazer com ela?”
De quem são essas frases? Palpites? Pois bem: elas são de Karl Marx.
Já tinha escutado isso na aula do mestrado. Mas encontrei outras fontes:

2 de out. de 2008

29 de set. de 2008

Quem conta um conto

O Presidente do PEN Clube do Brasil e
a Editora Tempo Brasileiro
contam com sua presença amiga
por ocasião do lançamento do livro


QUEM CONTA UM CONTO
Estudos Sobre Contistas Brasileiras Estreantes Nos Anos 90 E 2000


Coordenado por
HELENA PARENTE CUNHA


Participantes:
Aderaldo Luciano dos Santos
Alessandra Garrido Sotero da Silva
Ana Renata Baltazar
Anna Beatriz Paula
Christina Ramalho
Igor Fagundes
Laura da Silveira Paula
Marcos de Carvalho
Maria Aparecida Rodrigues Fontes
Nícea Helena Nogueira
Osmar Soares da Silva Filho
Vera Lúcia da Silva Sales Ferreira

Dia 01 de outubro de 2008,
às 18h no PEN Clube do Brasil,
Praia do Flamengo, 172, 11º andar,
Rio de Janeiro.

Eu sou uma das contistas estudadas:)
Quem escreveu o "Renata Belmonte: As Intermitências do Ser" foi o Osmar Sores da Silva Filho, doutorando da UFRJ. Fica aqui registrado o meu público agradecimento por seu tão belo trabalho.

7 de set. de 2008

Autoritarismo


Decreto férias urgentes para mim e para o Vestígios!

No mês de setembro, farei parte de um grupo de pesquisas e não terei como postar. Mas prometo voltar logo:)

6 de set. de 2008

Meu primeiro amor


Aos nove anos, me apaixonei. Perdidamente. E, com quase uma década de vida, compreendi porque todas as músicas românticas que escutava falavam de dor. Antes de tal fatídica experiência, eu sempre me perguntava: não é o amor um sentimento bom, que nos deixa felizes? Porque, afinal de contas, os apaixonados só vivem se lamentando e sussurrando coisas tristes?
Pois então: aos nove anos de idade, me apaixonei. E conheci toda a angústia que apenas tal sentimento pode causar. Muitas foram as noites que fiquei sem dormir. Como todos os primeiros e melhores amores, o meu era absolutamente impossível e muitos eram os obstáculos que existiam entre nós.
O primeiro e mais doloroso empecilho de todos usava um vestido azul: isso mesmo, o meu primeiro amor era visivelmente apaixonado por outra garota. Além disso, pertencíamos a mundos muito diferentes. E apenas tínhamos em comum o fato de que nos alimentávamos de sonhos e que detestávamos a realidade, este monstro com um relógio na barriga.
Isto mesmo: aos nove anos de idade, me apaixonei, completamente, pelo Peter Pan. E, alguns anos atrás, assistindo um filme sobre o autor de sua história, me reapaixonei pelo menino que nunca aceitou crescer. Também, nesta ocasião, mais uma constatação de nossa incompatibilidade: sempre detestei ser criança, até hoje, tento me livrar da minha infância.
Pois bem: superada tal paixão e, já adulta, compreendi que o amor se faz de metáforas e pequenas invenções cotidianas. Ou melhor: o amor é para aqueles que possuem imaginação e têm humor, a mais eficaz arma contra tragédias iminentes.
Mas Wendy? Sei... Boa de uma sonsa!

4 de set. de 2008

Os aiatolás culturais


Em 2003, após o lançamento de Femininamente, fui convidada para participar de um evento literário. Única mulher da mesa, aos vinte e um anos de idade, eu estava me sentindo super feliz por ter recebido tal convite. Mas, ao responder uma das perguntas da platéia, fui apresentada a um tipo de gente que não conhecia: os aiatolás culturais.
Os aiatolás culturais são pessoas que se acham acima de todos e que se sentem no direito de diminuir e distorcer qualquer opinião alheia. Não, ninguém pode discordar de nada do que diz um aiatolá cultural. Caso contrário, poderá incorrer em penas gravíssimas!
Os aiatolás culturais são facilmente reconhecíveis. Costumam, em qualquer de suas frases, citar Schopenhaur ou Baudelaire, falam muito, mas não dizem nada. O olhar do aiatolás culturais sobre os artistas mais jovens é sempre depreciativo, não, eles não conseguem admitir as novas gerações. E o mais curioso disso tudo é que os aiatolás culturais geralmente não são pessoas de alto quilate intelectual. Muitas vezes, são apenas seres que se autodenominaram grandes pensadores.
Não raro, encontro com alguns aiatolás culturais. E, quase sempre, é a mesma coisa: eles me aplicam provinhas. Com tom arrogante, indagam quais clássicos já li, qual o meu filme indiano favorito, dentre outras coisas. Quase sempre, quando isso acontece, fico prendendo o riso. Qual será a pena para quem não leu Joyce? E para quem não gosta de teatro? Cuidado, Bernardo e Aeronauta... É possível que, qualquer hora dessas, chegue um policial nas suas casas...
Esse fundamentalismo artístico é uma bobagem, ignora o quanto as pessoas são plurais. Adoro o Vestígios por isso: sempre aparece por aqui alguém bacana para dividir suas opiniões.
Sim, eu vou continuar adorando seriados americanos, Pop Art e rock. Não, eu não vou me fantasiar de descolada para que alguém acredite que sou uma escritora de valor. Sim, eu amo cinema e literatura. Qual é mesmo o problema de se gostar de muitas coisas?
Não, eu não sinto raiva ou qualquer sentimento negativo pelos aiatolás culturais. Na verdade, eu sei que eles são apenas crianças que não aprenderam como lidar com sua própria dor.

2 de set. de 2008

Don't call me daughter...


Ontem, estava vendo televisão e ouvi a seguinte frase: De seus pais até Jesus Cristo, todos já sonharam em ser ídolos do rock. Me acabei de rir. Sempre que estou arrumando minhas coisas, faço um dueto(na minha cabeça) de Daughter com Eddie Vedder. E sabe o que é melhor? Na minha fantasia, tenho uma voz super potente e a platéia vai ao delírio!
Pois então: confessem logo nos comentários com quem vocês dividem os vocais...

31 de ago. de 2008

Pequeno retrato de uma platéia azul



Fui com minha mãe e uma amiga para o lançamento de um livro e, enquanto estávamos na fila de autógrafos, fomos abordadas por um rapaz completamente bêbado, que se denominava escritor e que queria nos vender seu "livro"(uma xérox bonitinha) por cinco reais. Durante sua explanação sobre sua "obra", ele, bastante orgulhoso de seus feitos, afirmou que precisava do dinheiro de suas vendas para comprar drogas e bebidas, seus verdadeiros alimentos. Logo depois, numa tentativa desesperada de chamar atenção, passou a conversar em voz alta com os livros da livraria, cantou e dançou as "músicas que estavam no inferno que era sua cabeça." Na hora em que vi isso, eu não me contive e dei uma gargalhada. Minha mãe me olhou com um olhar severo e, após adquirir o livro do rapaz, condenou-me por minha atitude, disse que eu deveria ter pena de pessoas assim. Ainda tentou me obrigar a dar uma esmola para ele, mas, diante da minha evidente má vontade, desistiu. Não, eu não compro livros coagida, considero-os bens preciosos. Não, eu não tenho pena desse "escritor": ele apenas estava exercitando sua vaidade enquanto posava como mendigo. Não, eu não achei engraçada sua "performance": meu riso era nervoso, significava a constatação do que era pobreza de espírito. Depois de tomar todo o vinho possível do lugar, ele atendeu seu telefone celular (um aparelho bastante sofisticado, por sinal) e saiu sem comprar nenhum exemplar do livro que estava sendo lançado.
Sim, ele pensava que estava fazendo todos de palhaços. Mas era no seu rosto que estava o nariz vermelho.

29 de ago. de 2008

Só minhas músicas favoritas...

1- La mer (Charles Trenet)
2- November Rains (Guns and Roses)
3- Dream On (Aerosmith)
4- Jeremy(Pearl Jam)
5- Stairway to Heaven (Led Zeplin)
6- Hey Jude (Beatles)
7- Better man (Pearl Jam)
8- Águas de Março (Tom Jobim)
9- Panis Et Circenses (Mutantes)
10- If I ever lose my faith in you (Sting)
11- Alone in Kyoto (Air)
12- Alegria, Alegria (Caetano Veloso)
13- Sonata ao luar (Beethoven)

Me retiram destes dias cinzas.

28 de ago. de 2008

Quem disse?


Quando eu era criança, cantavam para mim:

Terezinha de Jesus deu uma queda
Foi ao chão
Acudiram três cavalheiros
Todos de chapéu na mão
O primeiro foi seu pai
O segundo seu irmão
O terceiro foi aquele
Que a Tereza deu a mão...


Quem inventou que isso é uma canção infantil? Essa é a música mais triste e assustadora que já ouvi na vida! Até hoje, fico em pânico quando escuto...

26 de ago. de 2008

Curta Vestígios da Senhorita B


Em breve, no computador mais próximo de vocês.

24 de ago. de 2008

Das coisas que nos distraem da morte


Todas as pessoas que me conhecem sabem que, apesar da minha alegria quase infantil, detesto ir para festas. Gosto muito de gente, só que não consigo suportar a melancolia que ronda tal tipo de evento, algo que mal consigo definir, mas que gruda na minha pele e borra meus olhos sem qualquer piedade. Só que, ontem, arrumando meu armário, descobri algo muito curioso: tenho pouquíssimas roupas para usar durante o dia, mas muitos vestidos de festa, alguns nunca usados.

Das coisas que me distraem da morte, sempre coloquei os livros e os filmes no pódio. Só que não posso deixar de mencionar a importância que as roupas possuem na minha vida. Mesmo tendo apenas a medalha de bronze, elas me permitem inventar minhas próprias farsas, livram-me da terrível condenação de ser a mesma o tempo todo. E, investigando o motivo de ter comprado vestidos que jamais serão usados, compreendi: dentro de mim, ainda vive a adolescente que fantasiava com bailes maravilhosos e que jamais se conformou com a mixaria que é a realidade. Ela, sem dúvidas, é a grande responsável por estas compras insensatas. Mas, não, não a culpo ou tento negá-la. Pois sei exatamente onde ela mora e o peso que é viver com tudo isso. Todas as noites ela está lá, enfiada num de seus vestidos, repetindo frases de seus filmes preferidos. Todas as noites ela está lá: bailando sozinha pelas páginas de um livro.

20 de ago. de 2008

Os Excêntricos B.




Escondida sob o véu da normalidade, se esconde a minha excêntrica família. E é por isso que defendo a não proibição do véu das mulçumanas em lugares públicos: certas coisas devem ser reveladas na intimidade. E como o Vestígios é minha casa, nada melhor que contar algumas histórias aqui.
Se nas fotografias parecemos todos tradicionais, na vida real a coisa é bem diferente. A grande marca da minha família é a esquisitice que carrega consigo uma boa dose de humor. Tenho um avô austero que sempre deixou claro que os netos o pertubavam, mas que, recentemente, me disse que dei para ele o melhor presente de sua vida: um rádio relógio falante em forma de maçã. (?!). Minha avó, apesar da idade, é super moderna, faz faculdade e, dias atrás, soltou essa: "isso de gay era ruim antigamente, mas hoje é muito divertido, eles têm aquela festa colorida, cheia de gente animada... Dia desses eu vou." Quantas vezes meu pai, ainda dentro de seus ternos bem cortados, se escondeu para dar sustos nos filhos? Já perdi a conta e espero que ele não esteja me esperando em algum lugar escuro. Minha mãe, bom, minha mãe é um caso para ser analisado com mais cautela. Durante as nossas infâncias, quase todas as noites, eu e me irmão chorávamos muito pensando que ela iria sair para jantar com meu pai. Mas sempre estávamos enganados: ela só estava arrumada porque tinha o hábito de experimentar suas melhores roupas naquele horário. E até hoje é assim: ela veste seus melhores vestidos e fica pela casa toda pronta como se estivesse indo para um baile.
Ainda tenho que falar de minha babá, minha outra mãe, que acha todo mundo preguiçoso e só não é nazista porque não sabe o que isso significa. Não raro, ela me dá ordens absurdas que eu acabo cumprindo por puro temor reverencial. Meu namorado? Bom, ele já me proibiu de falar qualquer coisa dele no Vestígios, caso o contrário me processa. Pois então: perceberam o quanto estou rodeada de gente estranha? Calma, esperem, vocês ainda nada viram: faltou meu irmão.
Ricardo, meu irmão, é quase uma encarnação não maligna do Coringa, arquinimigo do Batman. Ele passa seus dias aplicando pegadinhas, dando foras e passando trotes para seus amigos próximos. Sim, há dias em que isso é muito engraçado. Mas, não raro, ele se torna um capitalista insuportável.
Não sei precisar quantas vezes meu irmão me ofereceu dinheiro para que eu abraçasse alguém desconhecido na fila do cinema e dissesse para tal pessoa que eu a amava muito. Algum tempo atrás, até tentei, estava sem grana, mas na hora H: amarelei. Ano passado, ele disse para minha mãe que ia viajar com Tito, um novo amigo de Barra Grande. Quando ela perguntou quem era esse "Tito", ele mostrou a foto acima. E apontou adivinhem para quem?
Ontem, recebi um e-mail da "Câmara do Livro" com o seguinte teor:

"Parabéns,
Você ganhou o Jabuti.
Favor entrar no website da premiação, para fins de dar entrada no procedimento de resgate do prêmio.
Segue ilustração anexa.
Cordialmente,
Direção Executiva do Prêmio Jabuti."

Não, eu nem me abalei... Já imaginava que isso era coisa dele.
Meu irmão é fã absoluto de João Gilberto. Só espero que, no futuro, atenda meus telefonemas e não fique implicante como o ídolo.